CARROCEIROS, POR QUE NÃO?
Há mais de dois anos vivemos uma pretensa polêmica oriunda da iniciativa da Câmara de Vereadores de Porto Alegre que, através de uma lei, pretende retirar as carroças do trânsito da Capital. Além do absurdo social que esta medida representa e a total falta de sensibilidade justamente da instituição que deveria zelar pelo bem estar da população, em especial, aquela parcela mais vulnerável, a medida sofre de base legal e de viabilidade material.
Socialmente, não há sequer o que discutir. Porque as pessoas vivem de transportar o lixo da cidade? Vivem disto porque não lhes restou outra opção. Na sua maioria são pessoas que não tiveram oportunidades de estudo, que foram jogadas às margens da sociedade e usadas como mão-de-obra barata na construção civil ou em outras atividades pouco ou muito mal remuneradas. Encontram na atividade de coleta e triagem dos resíduos sólidos urbanos uma atividade digna e rentável para amenizar um pouco sua condição de pobreza. Foram se alojar nas ilhas do Rio Guaíba, justamente por ser uma área próxima ao centro da cidade e que tem áreas para alojar os cavalos. O resultado é pelas manhãs e ao final da tarde, uma caravana de carroças e carroceiros, se deslocando na ponte do Guaíba em busca de seu sustento.
Haverá aqueles que acusam as carroças de atrapalharem o trânsito, único inconveniente a ser expresso pelos defensores do fim destes veículos no cenário urbano.Fosse esse o principal problema a solução seria mais simples. Como o motivo dos deslocamentos dos carroceiros ao centro é buscar o lixo seco deixado nas calçadas pelos condomínios comerciais, bastaria determinar que o lixo seco não poderia ser colocado na via pública antes das 20hs, ou seja, horário após o pico da tarde que se encerra às 19h30m. Ocorre que, para limpar as salas e espaços comerciais antes do início do expediente as faxineiras e profissionais da limpeza iniciam sua jornada às 7hs da manhã, se ficasse até mais tarde representaria horas extras ou a contratação de outras pessoas o que significaria custos aos condomínios e prédios comerciais. Parece que aos olhos dos legisladores ficou bem mais fácil enfrentar os carroceiros do que os donos dos prédios comerciais do centro da cidade.
Ocorre que a proposta sequer reconhece os carroceiros como sujeitos, porque não abriu diálogo com eles. Pior, a condição da retirada das carroças após a solução do problema do trabalho para os carroceiros é uma mera intenção na lei, não sendo uma obrigação ou um impeditivo da retirada caso isso não ocorra.
Juridicamente falando a referida lei carece de base legal desde a sua gênese. É plenamente consolidada a decisão do STJ de que a competência para legislar sobre matéria de trânsito é da união. Não poderia uma administração proibir, por lei, que um veículo de carga circulasse pela cidade. Alías, Piracicaba tentou proibir que caminhões de cana de açúcar passassem no centro da cidade e não conseguiram. Ocorre que a CF em seu artigo 22, inciso XI define que é competência privativa da União legislar sobre trânsito e transportes. Esta competência se consolidou na Lei 9503 de 23 de setembro de 1997, o conhecido Código de Trânsito Brasileiro. Já esta lei específica define, em seu artigo 96 quais são os veículos segundo o tipo de e finalidade que podem circular em todo o território nacional. As carroças são definidas como veículos de tração animal para transportes de carga. Já as bicicletas são definidas como veículos de propulsão humana para transportes de pessoas. Pelo que pode-se depreender pela clareza da Constituição Federal e da legislação específica sobre o tema é impossível juridicamente um município proibir, em tese, que as carroças, ou as bicicletas, ou os caminhões, ou os automóveis, possam circular em suas vias urbanas.
Há sim, competência municipal na gestão do trânsito. Mas esta competência, como reza o artigo 24 do CTB é no sentido da operação e fiscalização do trânsito. Assim, pode a administração municipal de Porto Alegre proibir a circulação de carroças. Mas essa proibição terá que ser pontual, específica, em cada via, com a devida sinalização vertical indicando a proibição.
Se bem que, neste caso, deverá a EPTC dar continuidade ao processo de cadastramento que foi iniciada em 1999, consolidando as carroças como veículos parte do sistema de trânsito, dotados de placas e de sinalização apropriada e seus condutores como cidadãos do trânsito urbano, com documentação de identificação e certidão de propriedade dos seus veículos e animais, para responsabilizá-los como qualquer condutor brasileiro. Tudo dentro da lei e dos princípios da dignidade humana.
Finalmente, do ponto de vista prático, creio que a proibição em si, mesmo que vingue a norma ilegal, será inócuo. Este segmento social é invisível socialmente, muitos não possuem sequer carteira de identidade, vivem à sombra do estado, não sendo reconhecidos nem vistos. Como fará a fiscalização municipal. Irá recolher as carroças, recolher seus condutores? Levar estas carroças para um depósito? Esses veículos ficarão retidos? Por quanto tempo? Haverá multas e eles poderão retirar os veículos de sua propriedade e os seus animais? Seria essa a melhor forma de proceder? Creio que não.
Na verdade a proposta, se fosse séria e com um mínimo de responsabilidade social deveria ter sido proposta de forma inversa. Inicialmente, deveria propor a abertura de um diálogo com os seres humanos que vivem nesta situação. Saber de suas motivações e razões. Identificar possíveis novas competências e trabalhos com base no que essas pessoas já sabem e desejam fazer. Com base neste mapeamento, iniciar um processo de reinserção produtiva, sempre com diálogo e respeito às pessoas. Uma medida socialmente justa e muito mais eficaz. Desde que a motivação dos legisladores fosse resolver o problema destas pessoas e não resolver o caos no trânsito.
Aliás, aqui cabe mesmo uma observação técnica. A retirada das carroças em nada vai aliviar o suplicio dos motoristas no trânsito de Porto Alegre. Elas, em nada contribuem para a lentidão do trânsito e para o estresse diário dos condutores. As causas do caos no trânsito é o excesso de veículos, a falta de planejamento do uso e ocupação do território, o pouco investimento em transporte público e a ausência de uma gestão integrada e inteligente da circulação na cidade. As carroças em nada tem a ver com isso. Pior, com a saída das carroças, caso isso ocorra, serão necessários mais caminhões para retirarem as 180 toneladas de lixo diário do centro da cidade o que, certamente irá piorar as condições de trafegabilidade no centro da cidade.
Assim, na ótica dos direitos humanos parece claro que a medida é ilegal, inócua e anti-social. Infelizmente, não é a única. Para isso existem organizações sociais como a Liga de Direitos. Porque onde houver uma violação de um direito humano, haverá um coração humano indignado lutando a favor de quem precisa.
Socialmente, não há sequer o que discutir. Porque as pessoas vivem de transportar o lixo da cidade? Vivem disto porque não lhes restou outra opção. Na sua maioria são pessoas que não tiveram oportunidades de estudo, que foram jogadas às margens da sociedade e usadas como mão-de-obra barata na construção civil ou em outras atividades pouco ou muito mal remuneradas. Encontram na atividade de coleta e triagem dos resíduos sólidos urbanos uma atividade digna e rentável para amenizar um pouco sua condição de pobreza. Foram se alojar nas ilhas do Rio Guaíba, justamente por ser uma área próxima ao centro da cidade e que tem áreas para alojar os cavalos. O resultado é pelas manhãs e ao final da tarde, uma caravana de carroças e carroceiros, se deslocando na ponte do Guaíba em busca de seu sustento.
Haverá aqueles que acusam as carroças de atrapalharem o trânsito, único inconveniente a ser expresso pelos defensores do fim destes veículos no cenário urbano.Fosse esse o principal problema a solução seria mais simples. Como o motivo dos deslocamentos dos carroceiros ao centro é buscar o lixo seco deixado nas calçadas pelos condomínios comerciais, bastaria determinar que o lixo seco não poderia ser colocado na via pública antes das 20hs, ou seja, horário após o pico da tarde que se encerra às 19h30m. Ocorre que, para limpar as salas e espaços comerciais antes do início do expediente as faxineiras e profissionais da limpeza iniciam sua jornada às 7hs da manhã, se ficasse até mais tarde representaria horas extras ou a contratação de outras pessoas o que significaria custos aos condomínios e prédios comerciais. Parece que aos olhos dos legisladores ficou bem mais fácil enfrentar os carroceiros do que os donos dos prédios comerciais do centro da cidade.
Ocorre que a proposta sequer reconhece os carroceiros como sujeitos, porque não abriu diálogo com eles. Pior, a condição da retirada das carroças após a solução do problema do trabalho para os carroceiros é uma mera intenção na lei, não sendo uma obrigação ou um impeditivo da retirada caso isso não ocorra.
Juridicamente falando a referida lei carece de base legal desde a sua gênese. É plenamente consolidada a decisão do STJ de que a competência para legislar sobre matéria de trânsito é da união. Não poderia uma administração proibir, por lei, que um veículo de carga circulasse pela cidade. Alías, Piracicaba tentou proibir que caminhões de cana de açúcar passassem no centro da cidade e não conseguiram. Ocorre que a CF em seu artigo 22, inciso XI define que é competência privativa da União legislar sobre trânsito e transportes. Esta competência se consolidou na Lei 9503 de 23 de setembro de 1997, o conhecido Código de Trânsito Brasileiro. Já esta lei específica define, em seu artigo 96 quais são os veículos segundo o tipo de e finalidade que podem circular em todo o território nacional. As carroças são definidas como veículos de tração animal para transportes de carga. Já as bicicletas são definidas como veículos de propulsão humana para transportes de pessoas. Pelo que pode-se depreender pela clareza da Constituição Federal e da legislação específica sobre o tema é impossível juridicamente um município proibir, em tese, que as carroças, ou as bicicletas, ou os caminhões, ou os automóveis, possam circular em suas vias urbanas.
Há sim, competência municipal na gestão do trânsito. Mas esta competência, como reza o artigo 24 do CTB é no sentido da operação e fiscalização do trânsito. Assim, pode a administração municipal de Porto Alegre proibir a circulação de carroças. Mas essa proibição terá que ser pontual, específica, em cada via, com a devida sinalização vertical indicando a proibição.
Se bem que, neste caso, deverá a EPTC dar continuidade ao processo de cadastramento que foi iniciada em 1999, consolidando as carroças como veículos parte do sistema de trânsito, dotados de placas e de sinalização apropriada e seus condutores como cidadãos do trânsito urbano, com documentação de identificação e certidão de propriedade dos seus veículos e animais, para responsabilizá-los como qualquer condutor brasileiro. Tudo dentro da lei e dos princípios da dignidade humana.
Finalmente, do ponto de vista prático, creio que a proibição em si, mesmo que vingue a norma ilegal, será inócuo. Este segmento social é invisível socialmente, muitos não possuem sequer carteira de identidade, vivem à sombra do estado, não sendo reconhecidos nem vistos. Como fará a fiscalização municipal. Irá recolher as carroças, recolher seus condutores? Levar estas carroças para um depósito? Esses veículos ficarão retidos? Por quanto tempo? Haverá multas e eles poderão retirar os veículos de sua propriedade e os seus animais? Seria essa a melhor forma de proceder? Creio que não.
Na verdade a proposta, se fosse séria e com um mínimo de responsabilidade social deveria ter sido proposta de forma inversa. Inicialmente, deveria propor a abertura de um diálogo com os seres humanos que vivem nesta situação. Saber de suas motivações e razões. Identificar possíveis novas competências e trabalhos com base no que essas pessoas já sabem e desejam fazer. Com base neste mapeamento, iniciar um processo de reinserção produtiva, sempre com diálogo e respeito às pessoas. Uma medida socialmente justa e muito mais eficaz. Desde que a motivação dos legisladores fosse resolver o problema destas pessoas e não resolver o caos no trânsito.
Aliás, aqui cabe mesmo uma observação técnica. A retirada das carroças em nada vai aliviar o suplicio dos motoristas no trânsito de Porto Alegre. Elas, em nada contribuem para a lentidão do trânsito e para o estresse diário dos condutores. As causas do caos no trânsito é o excesso de veículos, a falta de planejamento do uso e ocupação do território, o pouco investimento em transporte público e a ausência de uma gestão integrada e inteligente da circulação na cidade. As carroças em nada tem a ver com isso. Pior, com a saída das carroças, caso isso ocorra, serão necessários mais caminhões para retirarem as 180 toneladas de lixo diário do centro da cidade o que, certamente irá piorar as condições de trafegabilidade no centro da cidade.
Assim, na ótica dos direitos humanos parece claro que a medida é ilegal, inócua e anti-social. Infelizmente, não é a única. Para isso existem organizações sociais como a Liga de Direitos. Porque onde houver uma violação de um direito humano, haverá um coração humano indignado lutando a favor de quem precisa.
Mauri Cruz é advogado ambientalista com especialização em direitos humanos pela UFRG/ESMPU. É Diretor Regional da Associação Brasileira de ONGS – ABONG. É membro do Conselho Diretor do Instituto Ruaviva e do Instituto de Estudos Jurídicos em Direitos Econômicos, Sociais, Culturais e Ambientais – IDHES. É membro da Liga dos Direitos. Foi Diretor Presidente da Empresa Pública de Transportes e Circulação de Porto Alegre – EPTC e Diretor Presidente do DETRAN RS.
3 comentários:
me and my wife have been researching 2012 for about 2 years now and have allready started planning they say by 2010 you will see it in the sky and i think thats about the time we will have everything ready we are looking to start a survival group or if anyone else has one that we can join let me know ill check back later thanks
[url=http://2012earth.net/switch_to_consciousness_2012.html
]mayan predicted
[/url] - some truth about 2012
"Assim, na ótica dos direitos humanos parece claro que a medida é ilegal, inócua e anti-social. Infelizmente, não é a única. Para isso existem organizações sociais como a Liga de Direitos. Porque onde houver uma violação de um direito humano, haverá um coração humano indignado lutando a favor de quem precisa."
Esse texto é um ABSURDO. Engraçado que você cita os direitos humanos nesse texto, mas e o direitos dos animais? Em momento algum você citou a precariedade em que esses animais são tratados. Trabalhos excessivos, que de tão excessivos, muitos morrem de exaustão. Um texto de extremo mau gosto e anti-ético. Nos EUA, país onde residi por muitos anos, maus tratos a animais dá CADEIA. E não interessa se quem maltrata é pobre ou rico. Ser pobre não justifica tamanha crueldade. Afinal, eles também têm direitos, não?
Ou no seu mundinho pequeno animais estão no mundo pra trabalharem até a morte pra humanos mesmo?
As visões do autor (a) desse texto são muito limitadas. Típico de cidadçoes de terceiro mundo (com cabeças de terceiro mundo).
Por causa de "cidadões" como você, que esse país de merda não vai pra frente.
"A grandeza de uma nação pode ser julgada pelo modo que seus animais são tratados." Mahatma Gandhi.
Quem deixou esse estúpido publicar um lixo desses na internet, ajudando a deseducar as pessoas e estimulando o ATRASO em Porto Alegre? Em nem UMA ÚNICA LINHA SEQUER esse senhor mencionou a selvageria com que esses "cidadãos" que tÇem tantos "direitos humanos" a reivindicar tratam os pobres animais. Não...aparentemente os cavalos servem única e exclusivamente para sustentar quem não teve hombridade de procurar um meio mais JUSTO e RESPEITOSO de sustento. "Advogado ambientalista?????" Rá. Essa foi boa.
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