A vida na cidade depende da sua parcela de espaço que é destinada à circulação porque quase toda atividade humana está relacionada a algum tipo de transporte. O abastecimento de água, energia elétrica e informações rápidas circulam por redes especiais, porém tudo mais, pessoas e bens, dependem da organização do espaço onde circulam e, cada vez mais, a vida das populações urbanas estará associada à mobilidade de passageiros e mercadorias.
O sociólogo e engenheiro Eduardo de Vasconcellos, em seu livro "Circular é Preciso”, assinala que a ampla influência da circulação urbana sobre a qualidade de vida das populações acarreta também efeitos negativos sobre a sua saúde e a integridade física das pessoas que ele identifica como um "tributo não-declarado” pago à macro-acessibilidade urbana.
Em um retrospecto sobre a vida nas cidades brasileiras ao longo do século passado, observa-se uma sucessão de fases: A "belle époque” que terminou com a eclosão da crise econômica de 1929, cujos efeitos se prolongaram até o conflito da 2ª Guerra Mundial. Este período foi seguido de uma explosão demográfica com intensa urbanização e difusão do uso de veículos motorizados, acompanhada de uma industrialização acelerada e desigual que agora superada por uma enorme expansão do setor de serviços. A adaptação das cidades brasileiras para a circulação das mercadorias e da força-de-trabalho foi suplantada pela ampliação do espaço destinado à circulação do transporte individual, sob a égide do automóvel como veículo privado e meio de locomoção almejado por todos.
Esta postura de privilégio ao transporte individual permanece ainda cercada pela aura de modernidade que está levando as cidades, tanto no Brasil quanto no exterior, a um impasse: Se todas as pessoas usassem automóvel para circular na cidade, o espaço necessário para circulação e abrigo de todas as demais atividades relacionadas ao trânsito urbano seria maior que o espaço ocupado pela própria cidade levando a agravar os problemas que se pretendia resolver.
Quanto à prestação do serviço de transporte coletivo urbano era, em um passado não muito distante, era garantida por serviços de transporte urbano eletrificado, implantados no Brasil por empresas concessionárias estrangeiras. Estas foram foi substituídas, no após-guerra, por serviços anárquicos pulverizados e por empresas públicas encarregadas de manter operando a quase-sucata recebida como serviço urbano de transporte coletivo complementado com serviço de ônibus. Era um esquema circunstancial impossível de alcançar uma situação de equilíbrio de resultados e sucumbiu diante da proliferação de oferta privada de serviços de ônibus. As empresas que surgiram neste período viam seu negócio como resultado exclusivo de seu pioneirismo e esforço empresarial, sem se dar conta que exerciam um serviço público cuja titularidade é do Estado.
Esta definição, atualmente explícita na Constituição Brasileira, atribui ao transporte coletivo urbano, o caráter de serviço essencial que pode ser exercido por empresas privadas, porém como delegadas pelo Governo Estadual ou Municipal, como concessão a serem atribuídas mediante certames públicos de concorrência e regularizadas sob a forma de contratos.
A ação do Governo Federal que já foi excessiva no período autoritário de governo militar, a ponto de até definir tarifas dos sistemas locais de transporte, tornou-se depois estimulante enquanto existiu a EBTU que veio a ser extinta por uma concepção equivocada de descentralização de responsabilidades. Atualmente, o Governo Federal retoma seu papel de fomento através do Ministério das Cidades e, apoiado na nova legislação do "Estatuto das Cidades”, formulando uma política federal para as redes de cidades que são, até mais do que antes, o suporte físico da parcela mais dinâmica da atividade econômica do país.
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